Passaram-se anos. Nunca mais te vi. Fui muitas vezes ao monte, demasiadas até. Olhei vezes sem conta para as marcas das tuas mãos no vidro da casa do meu pai, e elas continuavam lá. Nunca mais vieste. Nunca mais voltaste, e eu apenas desejava que o fizesses.
Procurei na internet dias a fio, deitando-me imensamente tarde, ouvindo os grilos, algo sobre ti. Relatos de acontecimentos estranhos, mas nada era semelhante. Nunca soube o que eras. Aquele dia na janela foi algo de diferente. Vi a tua face, no vidro, e as mãos. E depois vi-te a desaparecer como uma sombra. Não eras humana, disso eu tinha a certeza. Mas isso não me assustava, reconfortava-me. De humanos já estou eu farta. No entanto, jamais de procurei. Jamais escrevi sobre ti. Nunca mais pude. Formei a minha família, tenho o meu trabalho, os anos passaram-se. As memórias de ti nunca desapareceram, as visões também não, mas mesmo assim nunca mais me dediquei a descobrir o que eras. Passaste, infelizmente, pelo tempo e desapareceste tão rápido quanto chegaste. Porquê? Porque me fizeste isto?
Naquela manhã estava quente. Muito quente. Os miúdos tinha ido para casa dos avós, porque o meu sogro fazia anos. O meu marido tinha ido também, e eu ficara sozinha em casa, olhando para o vazio, ligando de vez em quando a televisão. A minha mãe morrera à pouco tempo, precisava de espairecer. Foi isso que fiz. Agarrei na carteira, saí de casa no meu carro actual, bem diferente do carro dos meus sonhos que se desfez à minha frente, e fui ver o mar. Ver o mar ajuda sempre, ver o mar é reconfortante, talvez a única actividade onde eu não me lembro de ti. A verdade é que as memórias de ti me assombram, positivamente, ao longo destes 14 anos. Parei o carro. Havia um penhasco enorme ao pé do mar. O penhasco donde a minha amiga Bella caíra um dia. Nunca contei isto a ninguém, foi demasiado terrível. Éramos as duas pequenas, eu e Bella, e ela caíra do penhasco. Eu tentara salvá-la, mas foi tarde demais. Foi horrível. Ela desapareceu nas águas.
Mesmo assim eu mantinha uma relação muito forte com esse penhasco, era demasiado importante para mim. Mesmo depois de tudo, eu continuava a subi-lo e a olhar para o mar quando estava triste.
Subi. Vi o mar, confrontado com o céu, os dois combatendo constantemente tentanto ocupar mais um bocado da Terra. Mas isso era impossível. Havia a linha, a linha que separava o mar do céu. E no entanto, estavam numa tão grande harmonia, numa divisão tão exacta, tão pouco humana e perfeita.
Distraí-me. Olhei para a linha do horizonte e continuei a andar no penhasco, aproximando-me cada vez mais de uma pedra que lá estava. Subi-a. Não parecia haver perigo. Como eu estava enganada. Subi tão rápido como desci. A pedra cedeu e torci o pé. Desiquilibrei-me na direcção do mar, e foi tudo tão rápido. Eu a cair. O penhasco sempre ao meu lado, acompanhando-me com os seus olhos que já mataram pelo menos uma vez, deixando-me cair. Via o mar mais perto, cada vez mais perto. Finalmente, embati com toda a força contra a água. O estrondo foi enorne, e não me lembro de mais nada senão de me deixar ir, de me deixar afundar. Estava demasiado atordoada, não conseguia nadar, embora fosse óptima nessa área. A vida passou-me à frente. Completamente. Foi aí que me apercebi do que se estava a passar, e comecei a espernear. Só me lembrava dos meus filhos, do meu marido, de todas as pessoas que me iriam perder. E sobretudo imaginava agora, muito melhor, o sofrimento por que Bella devia ter passado quando ela caiu. Tentei nadar, mas já estava demasiado longe da superfície, e o fôlego diminuía a cada segundo.
Desisti. Não valia a pena lutar. Ia morrer. Morrer como morreu Bella. Pensei "para toda a gente estou a pagar pelo que fiz", algo que eu não fiz. Não empurrei Bella, como muitos dizem. Tentei ajudá-la, atirei-me à água, ao contrário do que aqueles que não ajudaram no meu salvamento pensam. Não discutimos, como a maior parte inventa. Foi simplesmente um acidente, mas agora vai fazer-se justiça. Eu vou morrer da mesma força. Foi então que meti isso na cabeça. Fechei os olhos, mas não expirei. Queria entender a morte.
Estava muito calma, esperando pelo momento. Não chorava. Estava em paz. Em paz comigo própria. Estava pornta para morrer.
Mas não morri.
Foi então que algo que eu não soube dizer o que era me agarrou os braços e se colocou enconstado a mim, com os seus braços em torno do meu ombro, e me começou a puxar para cima. Já estava tão atordoada que não disse nada, nem me mexi.
Continuou a puxar-me, lutanto pela minha vida. Percebi que era uma mulher, porque os seus cabelos rossavam no meu pescoço. Mais tarde, pensei, brincando "deve ter sido uma sereia ahahaha". Claro que não.
Quando finalmente cheguei cá em cima fui encostada cuidadosamente a uma rocha, e sentia as suas mãos afastarem-se de mim devagar, lentamente, e os seus cabelos deixarem de roçar no meu pescoço. Não conseguia abrir os olhos. Mas conseguia prever onde estava.
Lancei o meu braço para a frente e agarrei o dela. Prendi-a. Ela tentou puxá-lo, mas eu não deixei.
- Bella? - perguntei, insconcientemente.
O teu braço não deslizou, desvaneceu-se na minha mão. Aí abri os olhos. Não vi pessoa alguma, coisa alguma. Sei que foste tu. Voltaste. Voltaste!
Atordoada, apenas sabia de uma coisa. Fui até casa do meu pai. Senti que o devia fazer.
Entrei, e a primeira coisa que fiz foi olhar para a janela. As tuas mãos já não estavam lá. Não eram humanas, tentei muitas vezes tirar as marcas, mas elas nunca saíram. Foste TU. Agora tenho a certeza. As tuas mãos desapareceram, foste tu. Sei que foste. Foste tu, Bella. Não morreste no mar, estás aqui comigo. Voltaste. O espírito não morre, estás aí algures. Estás e voltarás, como agora. Desejo ver-te. Desejo falar-te. Desejo agradecer-te. Se todos soubessem disto, nunca mais me culpariam. Mas não importa. Isto é só nosso. Apenas eu sei. Apenas eu sei que estás de novo aqui.
É simples, para todos. A Bella. Tu. Voltaste.
CONTINUA...
CONTINUA...
6 comentários:
Eu votei, claro, nas Histórias. Junta as histórias às reflexões na tua escrita, terás o maior sucesso. Aposta também na correcção linguística, vai perguntando sobre isso aqui e acoli. Tens potencial, Sofia, a sério. Eu gosto muito das tuas histórias. Fazem-me lembrar alguns dos meus sonhos, verdade. "Passaste, infelizmente, pelo tempo e desapareceste tão rápido quanto chegaste. Porquê? Porque me fizeste isto?", está tão bonito!!! Continua.
Beijinho
Saqndra (Statler)
:) As sondagens servem para me ajudar a escolher o que vou escrever a seguir, para saber se estou a ser muito repetiviva, quando me apetece escrever muitas vezes o mesmo tipo de texto saber se as pessoas gostam, e isso. E para além disso sou viciada em sondagens, por tanto morro de inveja quando no MEU blog há uma mas, claro, não vou votar! Quando encontro nos dos outros é logo, nem penso duas vezes!! No site dos Laços de Sangue practicamente vou lá para votar ahahah nas sondagens... SOFIA DEIXA A SUA MARCA E QUE NINGUÉM A CONTRARIE ahahah xD!!
E eu costumo fazer isso, por exemplo, o livro é um bom exemplo, e aqui vou fazê-lo também, seguindo os conselhos todos que me dão ehehehe tem de ser, saber o que está mal é o segredo para ficar bem! :)
OBRIGADA :D
Beijinhos
sofia
PS: Correcção linguística? É que não percebi aquela parte do "vai perguntando sobre isso aqui e ali", estavas a falar de sondagens?
Olá sofia. Não estava a falar de sondagens. Pergunta lá em casa quando tiveres dúvidas a escrever algo. Eu não sou excelente a escrever, mas consigo perceber quando algumas coisas estão mal. No teu caso, acho que escreves muito bem, mas já vi um erro aqui e acoli que, sinceramente, acho natural cometeres (quem não comete?). Mas eu sei que escreves a sério e, por isso, deves escrever o melhor que conseguires. Então, acho que deves procurar sempre dar o teu melhor. A tua mãe é um bom recurso eheheh Acho que neste caso as sondagens não funcionariam...
Beijinhos!!!
PS- Livro??? Eu quero ler isso! ehehehhe
Ah ok :) Ehehehe percebi tudo mal :S E pois, claro que não funcionavam, mas enfim... mente humana :S
Sabes, mas por vezes os erros são por preguiça... isto é mau, mas é verdade. Eu escrevo, e por vezes é tão grande e eu quero ouvir a música que o volto a ler já pulicado no blog e depois tenho preguiça de voltar às mensagens e editar ahahahaha ok, isto é mau...
Beijinhos e obrigada
Sofia
PS: Sim, vamos ver se dá em alguma coisa... mas não sei, talvez o escreva apenas para mim. O tempo dirá!!
Sofia, a tua prima e minha sobrinha, Sandrinha, tem toda a razão!!! Escrever-se bem e dar-se erros, é como ter um belo vestido com uma nódoa!!! É que a nódoa nem se notaria se o vestido não fosse um belo vestido, o que não é um caso. Um erro nestes textos sobressai, ao contrário de um erro num texto fraco. Deverias escrever 1º em word e depois passar para aqui...issso permitiria não só corrigir alguns erros, como eveitar que perdesses os textos...
(a chata da mãe)
Sim... eu vou fazer isso... :)
E já agora "estou muito agradecida" por teres dito... sei lá... por exemplo "gostei"/"não gostei"/"detestei"... enfim, senhora escritora... ahhahahaha
sofiasantos
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