bastidores.

Olhei em volta. Consumiu-me a sombra da solidão, o desejo incontrolável de ter ali alguém! As cadeiras vazias, onde antes estiveram, as vozes que eu antes ouvira, os risos. Despediram-se com um bom natal e foram, desapareceram. Saltaram da cadeira com um sorriso na cara e a cadeira caiu. Fez um estrondo e não se mexeu mais. Acenei feliz e depois a imagem foi-se. Fiquei só eu e a cadeira, eu e a ausência de vida, a cadeira deitada no chão. Só restava eu olhando para as minhas mãos, fazendo figuras com os dedos, mordendo o lábio, enrolando o cabelo, sei lá, o que as pessoas fazem quando estão sós e não têm um telemóvel. Se tivesse um, com bateria, mexeria nele como toda a gente, sempre nas mesmas teclas, a fechá-lo rápido quando sem querer carrego na internet. Fico então a olhar para as mãos: esquerda, direita, esquerda, direita. Bom Natal, sou interrompida. Igualmente, stor, respondo. E regresso ao meu mundo, corro pelas escadas abaixo, procuro alguém. Procuro companhia, porque não quero ficar sozinha. Ouço os elogios de todos aqueles que gostaram da Marta (a juíza) e da festa. Elogios daqueles que gostaram do teatro e que, sem saberem, me fizeram TÃO, TÃO, feliz! E cada pessoa que encontro é uma presente, um grande presente. E permaneço, assim, incontactável e à espera que me venham buscar. Sentada nas escadas fúnebres e tristes, ausentes. Sentada nas escadas duras e frias. Nas paredes e nas janelas "boas festas", "bom natal", "bom ano novo", "finalmente férias". E eu escrevo também. Marcas da vida, marcas da presença. E eu nas escadas geladas, a chuva a cair tão pálida lá fora, cubos de gelo "bastante aguados", como o desenho de E.V.. Sons a ecoarem na minha mente, sons da Marta, sons das aulas, das pessoas, sons dos aplausos e dos ensaios furados. Sonhos e lembranças dos melhores momentos. E eu à espera. Tão doloroso, tão triste! Horas antes, fomos, muito caladinhos, até à sala e, sem ninguém saber, lá ligamos a internet do computador... "google", "youtube", curiosos para ver a implosão do bairro do Aleixo. Rimo-nos tanto, tão mauzinhos a ver explosões. E depois vimos os classificados para a Liga Europa. Passou o stor de ciências pela porta, olhou e não disse nada. Desligámos a correr e descemos as escadas.

Mas, de repente, olhei para o lado e ao meu lado apenas estava o corrimão, nada deles. Como é impressionante: o que há num momento morre no momento a seguir!

Lembro-me então da JG a correr, a entrar antes do tempo. Lembro-me deles a jogar futebol, lembro-me da stora  de informática a gritar-me, dizendo-me que hoje não tenho paciência para as tuas palhaçadas, e lembro-me de cantar "All I want for Christmas is you" em inglês, e da RP fracturar não sei o quê na mão e eu sublinhar as folhas de história com as duas mãos. E lembro-me de ciências, de e.v., de gozar com tudo. Da festa de Natal, das luzes de discoteca, connosco a dançar lá pelo meio, e do "We are the world". Lembro-me de tanta coisa, mas quando olhei em frente, as luzes que via transformaram-se nas luzes dos carros e dos candeeiros, lá fora, na rua, deformados pelo vidro molhado da chuva. Nada de festa, nada de música.

E a mãe chega. Lá vou eu, olho para trás e vejo o lugar onde FUI FELIZ. Olho para trás e não, nada se transforma. Continuo a ver o lugar onde fui feliz, e continuo a imaginar as pessoas e a lembrar os momentos. Continua tudo igual: os professores secas e os professores in, a fila do almoço, o bar repleto de gomas, a RP ali ao lado sempre a "mandar vir", o nosso gozo constante, o recreio. Continua tudo igual: eu continuarei a arranjar o cabelo com as mãos molhadas, a pegar-me com a stora. Continuares a jogar jogos nas aulas de TIC, continuaremos a ver filmes em história, e continuará tudo igual. Espero EU. E sabem? Eu espero mesmo, espero eternamente.