segunda-feira, 27 de junho de 2011

Memória assassina


Possuímos uma dádiva que nos foi dada. Ou até criada e descoberta por nós. Ou talvez até nada disso. Temos a memória. Com ela não deixamos que nada passe em claro, excepto certas partes da infância que a ciência explica que seja natural que nos esqueçamos, mas o resto dos acontecimentos e pessoas ficam guardados connosoco. Transportamos a nossa vida na palma das mãos. Andamos com ela de um lado para o outro. E é por isso que por vezes a perdemos, ou a deixamos fugir. Somos frágeis. Somos desastres naturais incapazes de fazer tudo correcto. E é por isso que erramos. E os erros ficam também na memória. Têmo-la connosco. Mas a questão é: não haverá coisas que preferíamos não nos lembrarmos? Coisas que cada vez que recordamos sentimos um vazio obscuro?
É verdade. Por vezes quando deixamos de ter algo preferimos nunca o ter tido, para que a falta não seja colossal como é. Odiamos quando algo nos foge. Odiamos quando a vida nos passa pelo meio dos dedos. Por mais que a tentemos agarrar ela não deixa, porque controlar não siginifica agarrar e prender. E se por vezes nem a controlamos quanto mais agarrá-la ou prendê-la! Nem seríamos capazes...
Há coisas que na verdade preferíamos esquecer. A memória é suficientemente assassina para acabar connosco rápida e facilmente... apenas através de memórias que mais valia não existirem.
E isto é egoísta. Os humanos são egoístas. É egoísta pensar que preferíamos esquecer alguém. É muito egoísta mesmo. Cada pessoa, sobretudo se é boa pessoa, tem direito a ocupar o seu lugar na vida dos que a rodeiam... ou rodeavam. E é muito mau essas pessoas quererem esquecê-la. Mas por vezes tem de ser assim. Para a nossa sobrevivência, uma coisa que tornamos tão preciosa.
Mas é horrível. É horrível olhar para vídeos, fotografias ou simplesmente pensar em pessoas que nos fugiram simplesmente sem controlo. Que foram levadas sem qualquer tipo de espera ou tolerância. Que desapareceram sem direito a recados, sem direito a últimas palavras. É horrível. E todos têm se aguentar e se perguntam como o fazem. Na verdade fazem-no, mas nem sabem como... eu não sei como o faço. Ando para aqui a deambular, a representar e a escrever sem saber como sou capaz. Conheço pessoas que estariam mortas (também) ou deprimidas. Isto se eu não estou morta. Figuradamente. Tenho a cabeça tão distante do  resto de Mundo que não sei se posso ser considerada uma pessoa viva. Sinceramente não sei. Mas isso agrada-me de certa forma. Agrada-me poder tocar nos quen já cá não estão, mas mata-me profundamente não poder abraçar essa gente.
E esses sonhos que tenho... em todas as datas especiais. Todas as datas... dias 13 e não só... um sonho vem e as memórias regressam. Sonhos em que abraço pessoas que já cá não estão. Especificamente UMA pessoa que já cá não está. Aliás, talvez esteja. E esse desejo que me governa, esse desespero que me leva e me torna ausente, agrada-me. Alivia-me. É o abraço de que eu tanto preciso, o abraço que eu todos os dias anseio. Só tenho pena de que dure apenas os segundos da imaginação e seja tão real como um sonho.
E são essas as memórias assassinas. As memórias que não regressam mais. As memórias que vieram, deixaram marcas e foram sem piedade. E não voltam. Nunca mais voltam.
Na verdade, se me perguntassem se eu queria mesmo esquecer eu diria que não. Usaria da minha cobardia e afirmaria indignada que não. No fundo, escrevo que gostava de esquecer esses momentos, mas na verdade não queria era que eles tivessem algum dia terminado. E é por isso que eu diria que não. Diria que não e pensaria que sim. Viveria na incerteza, na incerteza em que todos vivemos.
E são essas memórias assassinas que matam. Matam mesmo. E o mais interessante é que isso é legal. Chama-se suicídio. Não devia. É engraçado. É cómico. As memórias matam-nos, chama-se a isso suicídio e somos nós próprios a agir. Porque as memórias somos nós mesmos! Nós criamos tudo isso! A pergunta acerca do assunto de esquecer não seria nada mais, nada menos do que nós interrogando-nos a nós próprios. É tão simples quando isso, tão simples quanto uma memória... mas tão complicado como esquecer, e tão complicado como no fundo não o querer fazer...

15 comentários:

daniela fernandes disse...

Se tu dizes que adoras o meu blog que posso eu dizer acerca do teu?
Este texto? Deixa-me sem palavras, como tantos outros que já aqui publicaste. Dizes tudo, ou quase tudo, mas o quase mais importante. Que mais nos toca, que mais me toca.
Eu podia ir aqui analisando parágrafo a parágrafo, mas só acabavas de ler o comentário umas valentes horas depois de teres começado..
Recordaste que aqui há uns dias não estava muito bem (puxa pela memória Sofia ahah), e bem, eram mesmo estes os assuntos. E falaste por mim, acredita! Disseste tudo aquilo que eu queria ter dito, mas que não consegui. Por não ter forças para o fazer, nem vontade. Com medo da possibilidade de ao dizê-las, elas se tornariam ainda mais reais. Por sorte está tudo bem, por agora.
Eu adorei este teu texto, acredita que sim . Está no meu top de escritos teus que mais me tocaram :)
Para além de Natural Disaster, como todos nós, és também um fenómeno. Um fenómeno natural!
Como não sei a quem devo agradecer, agradeço-te a ti, pelo facto de nos termos cruzado nesta demanda que é a vida.
um beijo enorme, querida Sofia.
daniela fernandes

daniela fernandes disse...

gostei da fotografia ;)

common courtesy disse...

Oh, obrigada és mesmo querida! Mas adoro mesmo o teu blog... acredita!
E não digas isso... eu adoro os teus comentários... vou-te ser sincera: odeio aquelas comentaros a dizer: "adorei, fantastico, fabuloso, parabens..." Isso não diz nada. Se é para comentar é para comentar, para dizer a opinião... para dizer adoro põe-se no facebook ou no msn ou em qualquer outro sitio!
Ainda bem que está tudo bem, e ainda bem que falei por ti, porque nós realmente temos opiniões muito semelhantes... e tu também falas por mim, acredita!
E agora a sério, não pensava que gostasses tanto! Ainda bem que assim foi!
A há fenómenos naturais no Mundo... muitos... e acredites ou não tu és um deles. Para mim os fenómenos naturais são todas as artes, todos os humanos que se sabem expressar! E a escrita é uma dessas formas, e quem escreve muito bem como tu também é um fenómeno natural!
E agradeço-te a ti também, adoro o teu blog, dá-me inspiração para o meu, e tu és uma pessoa fantástica, bonita e sensívle!
Bjs,
Sofia
PS: porque é que assinas com minúsculas? (mais uma coisa engraçada)

common courtesy disse...

E ainda bem que gostaste da foto... confesso que também gosto muito dela!
Bjs

daniela fernandes disse...

hmm, em relação ao "adorei", não posso deixar de concordar.. vais o meu blog vês 30 comentários e raros são os que dizem alguma coisa!! Irrita-me.. passei um tempo considerável a escrever, a pensar, a reler para aquilo.. Dá a ideia de que nem leram. E depois, comentas determinados blogs, e a respota é "obrigada linda" .. deixa-me fula, por isso já desisti de me alongar em quem apenas está interessado em altos números em visitas :)

Merecias um rebuçado, porque foste a primeira a fazer-me essa pergunta, em todos estes anos que assim tenho assinado ahah

Não faço as coisas por fazer, porque sim... Não escrevo as iniciais do meu nome com letras minúsculas porque fica mais bonito. Faço-o, porque não vejo o dito Homem como algo de maior importância ou valor (que os outros).
Fomos todos um acidente da Natureza, surgimos das mesmas condições...
Admito que somos realmente os autores de grandes feitos, e admiro a quantidade e a qualidade das coisas que conseguimos efectivamente fazer. Mas no outro prato desta minha balança estam também todos os aspectos negros da nossa raça. Todo o mal que fazemos e continuamos a fazer, apenas porque sim. Porque podemos.
Assim sendo, a balança dos feitos e realizações da humanidade está completamente alinhada. Equilibrada. Tal qual a dos outros seres... Que não fazem o mal, por gosto. Mas que também não são capazes de mudar drásticamente as nossas (supostas) realidades e o Mundo, como nós somos.
Temos então os pratos todos na mesma posição, na mesma linha, na mesma igualdade.

Percebes ?
Detesto a ideia de me superioridade! E escrevo o nome em minúsculas como um símbolo, numa maneira indirecta de transmitir que não gosto disso. A private joke :p

common courtesy disse...

É verdade eu tenho lido os comentários do teu e é só isso que as pessoas escrevem! Mas não penses nisso, escreve por prazer, para mostrar a tua arte, quem não gosta paciência!
He, he, desde que seja de ananás ou pêssego!
E realmente tu és fantástica! A forma como fazes isso, a forma como pensas...
Acho engraçado como reparas nas palavras... isso das minúsculas... fantástico! A sério! Vou pensar em começar a fazer o mesmo... vamos ver... mas como o meu nome tem dois s vamos ver como fica... mas que interessa? As aparências não importam quando se quer transmitir algo tão profundo!
Plesa faz-me uma favor diz a certas pessoas do meu blog eu digo do teu está descansada... mas é que o meu blog está a ficar um pouco morto... com poucas pessoas!
Bjs,
SofiaSantos

daniela fernandes disse...

OK Sofia, considera feito :D
Vou fazer publicidade ahaha
beijinhos

daniela fernandes disse...

Fiz uma publicação no meu facebook xD e estou a ver se encontro blogues porreiros, o que é raro! A maioria é "que lindo".. e tu mereces ouvir bem mais que isso :D

common courtesy disse...

Obrigada está descansada que a cambada de malucos da minha turma também vai saber do teu blog! E acredita, podem ser crianças mas têm sensibilidade! :)
Bjs

joana fernandes disse...

Obrigada Sofia (:
concordo totalmente com este texto. A memória é assasina pois nem tudo que esta presente nela é bom. Passamos por bons e maus momentos e quase sempre desejamos esquecer os maus e então tentamos esquece-los mas ao esquece-los esta-mo-nos a matar por dentro. Porque nós somos memória! Ao querermos esquecer estamos a destruir tudo aquilo que nos compõe.

Beijinhos

common courtesy disse...

É exactamente isso que eu pretendia mostrar. A memória constrói-nos, sem ela somos apenas corpos sem alma que nada gravam nem memorizam. Ao tentarmos apagar os que nos compõe apagamo-nos a nós. :)
Bjs,
sofia santos

joana fernandes disse...

Sim, e também é impossivel apagar a nossa memória sem ela nao eramos o que somos hoje (:
Gosto muito do teu blog, acho que és directa e completamente genuina. Escreves acerca de temas muito interessantes e em cada texto pretendes transmitir uma mensagem e consegues sempre.Os teus textos não são vazios, não dizem sempre a mesma coisa, aprendemos muito com eles. E adoro o teu ponto de vista sobre as coisas :)

Beijinhos

common courtesy disse...

Obrigada mesmo! Eu tento sempre encontrar temas novos... e o meu segredo por vezes é ao som dos Anathema, Sigur Rós ou Coldplay...
Beijinhos

joana fernandes disse...

Sim, as músicas são uma verdadeira fonte de inspiração. Adoro Anathema tem umas excelentes músicas (:
beijinhos

common courtesy disse...

Pois é!
:)
Bjs,
Sofia