quinta-feira, 5 de setembro de 2013



"Mas a garota só diz disparates. Só lhe saem pela boca palavras indignas de serem ouvidas, e preces malditas, de ferro duro e duro de ficar. Saem-lhe os mais variados desagradados idiotas, e verdades loucas. Mas é nisso que ela acredita, foram essas palavras malditas que lhe moldaram os contornos grossos do corpo. Foram essas palavras malditas que lhe desenharam os lábios imperfeitos e desesperados. E os outros, como a minha compreensão a eles se estende, fixam os seus olhos de chamas no rosto e gritam desenfreados impropérios à sorte. Porque ela é irritante, porque ela muda, porque ela nos seus cabelos cor de palha velha e na sua t-shirt negra onde caberiam duas iguais a ela, dá cabo da paciência dos poucos que a tentam segurar. Mas esses, como ela, não são nenhuns coitados. Também eles, alguns deles, talvez porque ela não saiba escolher ou porque não soube negar ser escolhida, contribuem para o seu comportamento deprimente e enervante que não parece ter fim à vista. É a coisa mais desconfortante, mais incomodativa, mais violenta. 
Antes, a garota sorria. E ela ainda sorri, enquanto a sua boca se abre para o desconhecido. Mas agora ela ausenta-se mais, conseguem vê-la? Sentada num canto cheio de luz, de olhos vazios e cabelos caídos, costas curvadas a clamar de dor. E ela, calada, desta vez, explica finalmente de onde vêm todas as coisas que não diz por dizer. Calada e perdida, ela explica.
Como primeiro, antes de lhe atingirem a garganta, as palavras lhe dançam na cabeça. Como lhe torturam a cabeça até ela as dizer, por fim. Como ela pensa nos lugares aonde não pertence, nas pessoas que não suporta, no passado que não esquece e em tudo o que em si odeia. Como ela pensa em tanta coisa sem sentido e em como as pessoas parecem insistir, só por existirem (ou às vezes não), em fazer pior.
No fundo, por vezes, ela também diz, sem falar, mas eu consigo ouvi-la. Diz que gostava de ser como as outras raparigas e rapazes. Diz que deitava fora os pensamentos da sua mente, enquanto eu, de sorriso de quem sabe do que ela fala, lhe afirmo o contrário.
Ela responde qualquer coisa inconstante, faz de tudo para não me olhar nos olhos, e tenta ficar calada."